quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Feios

6ª feira passada fui ao shopping, à Americanas, especialmente para comprar um livro que há muito eu queria ler e que sabia que estava em promoção [depois que ler falo dele]. Daí, vejo na mesma prateleira, na mesma promoção um livro chamado "Feios" com a foto de uma criança na capa:




Claro que fiquei suuuuuuuper curiosa. Li então o resumo na contra-capa:
Tally está prestes a completar 16 anos, e mal pode esperar. Não para dar uma grande festa, mas sim para se tornar perfeita. No mundo de Tally, fazer 16 anos significa passar por uma operação que a transformará de "feia" em um ser incrivelmente belo e perfeito, e lhe dará passe livre para uma vida de glamour, festas e diversão, onde seu único trabalho é aproveitar muito.
Mas Shay, uma das amigas de Tally, não está tão ansiosa assim: prefere se arriscar fora dos limites da cidade. Quando Shay desaparece, Tally vai conhecer um lado totalmente diferente desse mundo perfeito - e, acredite, não é nada bonito.


Por 1 segundo cogitei a possibilidade de não levá-lo, mas já era tarde demais! Já tinha sido fisgada. A curiosidade foi tão grande que saí do shopping literalmente andando e lendo [isso pode ser perigoso. Não sejam tão loucos quanto eu!] Terminei de ler na 2ª feira à noite, com uma média de 100 páginas por dia. Eu fiquei um pouco chateada quando percebi que é uma série e não um livro isolado e que, pior, as continuações ainda não haviam sido traduzidas e lançadas no Brasil [eu não leio em inglês]. Para a minha sorte "Perfeitos" saí no fim deste mês. Já encomendei, claro. E como "Feios" foi lançado em abril, seguindo essa lógica talvez eu possa pedir "Especiais" de presente de Natal, hehehe... Mas, enfim...

Gostei MUITO. Muito mesmo!!! Não é exatamente um livro adulto, mas é mais interessante e bem escrito que a média dos livros classificados como infanto-juvenis que temos visto por aí ultimamente - cof! cof! Acho que dá pra saber de qual série estou falando, né...

O melhor desse livro não é nem mesmo a sua narrativa, a história, os personagens, a aventura, o romance e as reviravoltas, ou o cenário. Tudo isso é de fato muito bom e muito bem desenvolvido. Mas o aspecto crucial desse livro [e dessa série] é outro: que preço devemos pagar pela 'perfeição' externa? Pela beleza... Vale a pena?
Imagine o seguinte: você vive num mundo em que, alguns séculos atrás, nossa civilização, nosso modo de vida como o conhecemos foi extinto por uma praga que nós mesmos criamos. Mas o futuro não é nem de longe apocalíptico. É bem melhor do que o nosso mundo atual! Tudo é, literalmente, perfeito! Não há guerras ou disputas de qualquer espécie. Todos têm alta qualidade de vida e muita tecnologia. E todos são lindos. A nossa civilização vive em cidades-estado à base de desenvolvimento 100% sustentável, o que significa que a natureza está bem preservada e não precisamos mais recorrer tanto a recursos naturais. Tudo é reciclável. Os jovens têm a vida que a maioria dos jovens pediram a Deus: futilidades sem limites.

Dos 12 aos 16 anos os adolescentes da cidade Nova Perfeição vivem na Vila Feia, uma espécie de internato ondem estudam normalmente e aguardam o seu 16º aniversário ansiosamente, porque nesta data ganharão um presente do governo: uma completa cirurgia plástica, dos pés à cabeça, que lhe deixará literalmente perfeito fisicamente. E depois? É só alegria. Você se muda para Nova Perfeição onde viverá até a meia idade - quando escolherá sua profissão e fará a 2ª cirurgia - apenas aproveitando a vida: festa, festa e festa. Diversão de todo tipo, 24 horas por dia. Tudo à mão, muita liberdade, muita tecnologia. Roupas maravilhosas e nenhuma preocupação a não ser aproveitar a vida de balada em balada.

Esse mundo não parece perfeito demais? Não parece que tem algo errado aí? E se você for como eu - alguém não tão chegado em baladas e futilidades - realmente não ficaria tão animado assim com a chegada do 16ª aniversário. Mas há um problema: você não tem escolha! Na verdade a cirurgia não é um presente, é a lei! Todos devem ser perfeitos e iguais.

Tally é uma garota cuja todos os amigos já completaram 16 anos e se mudaram. Ela se sente ansiosa, pois se sente 'abandonada'. Não vê a hora de reencontrar seu melhor amigo, Peris, que fez a cirurgia há 3 meses. Durante uma aventura ela conhece Shay, que faz aniversário no mesmo dia que ela, mas não quer ser perfeita e foge algumas semanas antes. O problema é que sua fuga também trará consequências para a vida de Tally. E é aí que a história realmente começa. Tally descobre um mundo completamente novo e descobre toda a verdade sobre a cidade que ela acreditava ser o paraíso!

Os diálogos dos personagens e até mesmo as experiências e impressões da própria Tally são fantásticos, pois nos fazem questionar esse mundo de aparências onde nós vivemos, sem perceber. A grande maioria das pessoas não é e nunca será fisicamente perfeita, porém a mídia nos impõe um padrão: modelos e atores, principalmente. E como se não bastasse nos bombardeiam todos os dias com matérias sobre "como emagrecer", "como definir seus músculos ou sua barriga", "como ser mais sexy", "como disfarçar isso ou aquilo", sem contar as milhares de receitas de dietas, desde as mirabolantes até aquelas que passam no 'Jornal Hoje' e no 'Globo Repórter' especialmente elaboradas por 'especialistas' para cada tipo de 'problema'. Além é claro do universo de cosméticos - em boa parte inúteis - e das cirurgias plásticas para praticamente tudo... agora até transplante de rosto já está se tornando possível.

É importante não confundir aparência com saúde. Todos sabemos que obesidade pode ser um grave risco à saúde, mas não é porque você é magro que está livre de ter colesterol.
Também que não se confunda normalidade com desleixo. Ter vaidade, se cuidar é saudável... O que é preocupante é ser obssessivo com a aparência e se tornar um ser alienado, que não se preocupa com nenhuma outra questão realmente útil e importante. O que é triste e perigoso é fazer de tudo - de tudo mesmo - pela ilusão de ser perfeito e julgar tudo e todos a sua volta por esse prisma.
E é exatamente isso o que acontece no livro!!! Ser perfeito é essencial para ser aceito e se sentir bem consigo mesmo. Quando Tally começa a contestar esse universo, sua mente se abre e ela finalmente cresce de verdade. Cresce não como seus amigos da cidade, que apenas tem corpo de adulto, mas cresce como uma pessoa, alguém consciente e com discernimento para avaliar e ter opinião própria.

Um exemplo de como já estamos - de certa forma - vivendo esse pesadelo é uma situação que eu vivi há pouco tempo. Como já comentei antes, passei o 1º semestre doente. Há anos eu sofria pressão de todos para emagrecer, embora nunca tenha sido de comer em excesso e nem muito menos fosse obesa. Apenas tenho uma certa gordura localizada na barriga que só sai mesmo com abdominal. Eu só aceitava essa pressão porque a ginecologista disse que eu precisava de fato emagrecer para fazer o tratamento de ovário policistico, que é um problema muito incômodo.

Por causa da doença que tive no 1º semestre - foi pedra nos rins um tanto grave - emagreci 8 kg. Esse meu emagrecimento foi proporcional, ou seja, diminuiu tudo: o rosto ficou mais fino, as coxas também... enfim... tudo... mas o que diminuiu mais foi mesmo a barriguinha. E eis que depois de curada ouvi muitos 'elogios'. Mas sabe quando você não se sente assim tão bem com os supostos 'elogios', embora esteja feliz de entrar naquela calça jeans 38? Uma amiga me disse que eu estava procurando pêlo em ovo, pois é sempre bom ouvir que emagrecemos.
Depois eu entendi que estes 'elogios' vinham carregados de sarcasmo e hipocrisia. Um preconceito velado. Na real, significa simplesmente: antes você não estava adequalda para conviver conosco. E isso fica mais forte e perceptível quando é entre pessoas que foram lindas a vida toda - tipo uns parentes que eu tenho. Não to fazendo tempestade em copo d'água não! Já vi meninas magras e saudáveis saírem de agências chorando porque foram chamadas de 'gordas' demais para serem modelos.

Outro exemplo grotesco foi um colega comentar no orkut que tinha visto dois caras criticando o corpo da Cléo Pires no recente ensaio para a Playboy, mas que nenhum dos dois tinha moral pra não gostar da aparência dela porque ambos namoravam, segundo ele, "dois tribufus". E eu juro que fiquei imaginado o que seriam para ele "dois tribufus"? Duas mulheres fora do padrão da mídia provavelmente? E será que ele está dentro do padrão masculino imposto pela mídia? Se não está, ele tem tanta moral para falar disso quando os outros dois, pois também é, segundo sua própria concepção, "um tribufu". E o pior: tal comentário exdrúxulo veio de alguém que eu julgava inteligente.

Esse tipo de preconceito quanto aos defeitos físicos - que não são apenas a gordura ou cabelo liso / cabelo crespo - já estão tão entranhados na nossa sociedade que se tornaram naturais!

Esse preconceito aparece também quando se trata do estilo de vida. Se você, como eu, leva um estilo de vida 'fora do padrão' é certeza que já sentiu olhares tortos e já ouviu comentários maldosos disfarçados de piada.
"Por que você não sai todo fim de semana à noite como os outros da sua idade?"
"Por que você não está namorando?"
Credo, por que você diz que não quer casar?"
Não, não levo mais na brincadeira pois cada vez mais percebo que de brincadeira não tem nada. É como se quem não seguisse o padrão tivesse algum tipo de doença perigosa e contagiosa. E quem está neste confortável mundinho plástico tem medo de mudar e começar a pensar pela própria cabeça, ao invés de simplesmente seguir o convencionalmente aceito, como gado.

É por causa desse tipo de coisa, que já vem dos adultos que os rodeiam, que cada vez mais os adolescentes se desesperam fazendo QUALQUER COISA para se encaixar num grupinho idiota. Inclusive alguns absurdos que tem se propagado pela internet.
Eu nunca fui de me incomodar demais com essa baboseira toda. Tenho uma certa vaidade e orgulho, sim, claro! Mas nada exacerbado. Procurava tentar emagrecer por ordens médicas, mas nunca fui de ficar contando calorias ou evitando doces. No máximo procurava comer menos do que comeria normalmente.

Essa merda toda desse tipo de 'preconceito natural' só me incomodava na época de escola - quando eu também era adolescente - e hoje só incomoda realmente quando na presença desses olhares e comentários maldosos, que muitas vezes, contra a minha vontade, ecoam ainda dias depois. Porém, sempre passa... E de modo algum eu abro mão de ser quem eu sou para agradar alguém ou a um grupo. Esse é o meu maior orgulho e a minha maior convicção.

Como bem disse o personagem David, de "Feios" [vou ocultar um spoiler aqui pra não perder a graça de quem ainda for ler]:
Essa é a pior coisa que eles fazem com vocês. [...] O maior estrago é causado antes mesmo de eles pegarem um bisturi: todos vocês sofrem uma lavagem cerebral para acharem que são feios.

Por isso eu amei esse livro - que já virou best seller nos EUA e já tem previsão para ser adaptado pro cinema -, ele mostra, em um universo extremado é verdade, o quão nocivo tudo isso é! E com uma narrativa leve, gostosa e personagens muito cativantes e um pouco fora do comum.

Vi alguns comentários na internet de quem já é fã da série "Feios", dizendo que não gostaria que virasse a nova modinha. Bom, eu geralmente fico chateada quando alguma coisa que eu descobri de repente vira a mania de todo mundo. Só que, sinceramente, prefiro e ficaria muito mais feliz - e aliviada - que "Feios" virasse a nova moda do que essa merda alienadora que é Crepúsculo. Que aliás, até ajuda a propagar esses conceitos de beleza. Pergunte a uma fã de Crepúsculo porque ela gosta tanto e ela vai de responder, certamente: "Ai, porque Edward [ou Jacob] é lindo! Ai, ele é perfeito!"
Minha resposta: " ¬ ¬"

Ah, sim. Aproveito para colocar aqui o trailer do livro:

Um comentário:

nada complicada disse...

Adorei o Post, quando puder vou ler o livro, agora estou lendo a Trilogiua da Herança, mas só tenho tempo no fds, então tá meio difícil de terminar, mas eu chego lá rsrsrs...
Quanto a essa coisa de "padrão de comportamento", as pessoas realmente estão ficando idiotas... temos liberdade de escolha, não?? ultimamente ando questionando isso...

bjs

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